2020 foi, sem dúvida, um ano que marcou de forma perene a humanidade. Muitas transições, transformações, perdas, sacrifícios, mas também ganhos e aspectos positivos. Afinal, toda grande mudança traz também consigo aspectos de melhoria.
As transações de M&A, como não poderia deixar de ser, também foram significativamente impactadas por todas as características da pandemia. Inicialmente, transações foram rapidamente interrompidas devido à necessidade de afastamento e, sobretudo, pelos impactos desconhecidos que haveria sobre as empresas, economia, hábitos, etc. Esta brusca freada durou, no Brasil, até Julho. Passados mais de 100 dias da pandemia, os agentes econômicos começaram a computar os impactos, entender as consequências e lentamente as transações “estacionadas” voltaram à pista. Porém além dos negócios estacionados, muitos outros novos, e talvez até aquele momento nunca imaginados, passaram à agenda e o segundo semestre de 2020 foi extremamente movimentado em termos de transações realizadas, como por exemplo as diversas aquisições de empresas de tecnologia pelos titãs do varejo brasileiro como o Magazine Luiza. Além de transações de M&A, também houve uma retomada significativa dos registros de solicitações de abertura de capital na Bolsa brasileira. Neste momento, há mais de 40 pedidos de oferta registrados na CVM para análise e muitas aberturas iniciais de capital já ocorreram e estão para ocorrer.
Ao final, o balanço do ano de 2020 em termos de M&A foi positivo. O Brasil vinha quebrando recordes em volume de transações anuais desde 2017 tendo ultrapassado a barreira de 1.000 transações anuais em 2019 com a cifra de 1.231 transações segundo a pesquisa trimestral da KPMG. Em 2020, o Brasil continuou acima de 1.000 transações, tendo uma leve queda a partir de 2019 de 9,3%. Este resultado foi surpreendente e resultante de um movimento significativo e intenso ao longo do segundo semestre, tendo havido um peso muito maior do que o primeiro semestre, contando-se os meses de paralisação.
Gráfico 1: Evolução do número anual de transações no Brasil
Fonte: KPMG
A perspectiva para 2021 é muito positiva pois há transações que foram forçosamente movidas de 2020 para 2021 e muitas transações que passaram a fazer sentido devido aos impactos da pandemia sobre a economia. Obviamente que uma crise econômica como esta, sem precedentes, trouxe a necessidade de muitas consolidações, fusões e alterações de estruturas de capital para inúmeras empresas.
Em termos macroeconômicos, apesar da economia brasileira estar sofrendo com baixo crescimento, elevação da inflação e desvalorização do real, as forças econômicas por busca de escala, eficiência, adaptação aos novos desafios tecnológicos, consolidação de indústrias, e outros fatores, impulsionarão muitas transformações empresariais a partir de 2021 em diante. Uma questão que se colocou diversas vezes em 2020 era o impacto do câmbio sobre transações cross border uma vez que a crença inicial era que o Brasil havia se tornado “barato”. Porém esta crença é equivocada pois, em realidade, as empresas brasileiras ficaram menores em dólares e isto eventualmente pode afastar investidores. Adicionalmente, a instabilidade de nossa moeda também é um prejudicial pois o ganho ou perda cambial podem inibir investimentos de longo prazo.
Em termos setoriais, os principais destaques em 2020 foram Tecnologia e Telecom, Saúde, Serviços, Educação, Alimentos & Bebidas, Consumo & Varejo e Agronegócio.
Gráfico 2: Distribuição das Transações por setores em 2020
Fonte: KPMG
Vamos citar os principais racionais e transações em cada setor listado acima:
1. Tecnologia e Telecom: claramente, o principal setor de 2020 uma vez que para muitas empresas de outros setores sobreviverem e atravessarem a pandemia, a tecnologia e a telecomunicação foram chaves. Algumas transações notórias foram: atuação relevante da Locaweb comprando quase 1 dezena de empresas, aquisição da Linx pela Stone após uma acirrada disputa com a Totvs, aquisições feitas pela iFood e pela Sinqia. E confirmando a força deste setor, já em 2021 a Totvs anunciou uma das suas maiores aquisições selando a aquisição da RD Station por mais de R$ 2 bilhões;
2. Saúde: outro setor diretamente atingido pela pandemia com absoluta mudança do perfil de receita ao longo do ano, fechamento de portas, a Saúde que já vinha em franca consolidação, devido a razões seculares, acelerou em 2020 tendo como principal transação do ano o anúncio da fusão da Grupo Intermédica e Hapvida que resultarão o segundo maior grupo de Saúde no Brasil em capitalização de mercado, atrás somente da Rede D’or que fez sua IPO em 2020 e passou a ser o maior grupo de Saúde no Brasil em capitalização de mercado. Nos primeiros dias de Abril/2021, a Rede D’or anunciou 2 aquisições sendo uma em Minas Gerais do Hospital Biocor e outro em João Pessoa, na Paraíba, totalizando mais de R$ 1,3 bilhões em valor de ativos;
3. Serviços: utilizando esta nomenclatura de forma bastante ampla, incluindo aqui Serviços Financeiros, Serviços de terceirização e Outros, também houve muita consolidação ao longo de 2020 podendo citar por exemplo a continuação da consolidação do mercado de prestação de serviços de Mão-de-Obra terceirizada pela GPS e pela Verzani & Sandrini, as duas maiores companhias deste segmento que prometem aberturas de capital já em 2021;
4. Educação: com a necessidade de espalhar o ensino à distância por todo o território nacional, obviamente muitas mudanças empresariais ocorreram no setor educacional brasileiro. Empresas como Arco e Afya, ambas listadas nos EUA, continuaram a fazer aquisições seriais no Brasil. Outro destaque foi a quantidade de aquisições de instituições de ensino superior com cursos de Medicina. Os valores pagos por estas instituições atingiram recordes em 2020 e não parecem ter chegado nem próximo ao fim;
5. Alimentos & Bebidas: em 2020, a cadeia de food service foi abandonada e o consumo de alimentos no lar se tornou a única opção. Isto obviamente também trouxe impactos ao setor. A tendência de alimentação saudável, que se tornou secular, continuou a impulsionar transações. Alguns exemplos são o investimento do fundo de private equity Advent na CRM, dono da Kopenhagem e os movimentos feitos pela 3 Corações em seu segmento;
6. Consumo & Varejo: este setor que vinha menos movimentado nos anos anteriores voltou a mostrar pujança. Em 2020, a Arezzo e o Grupo Soma fizeram importantes aquisições para se consolidarem como detentoras das principais marcas de Moda no Brasil. Além disto, fundos de private equity voltaram a investir neste setor como fizeram no início dos anos 10 (2010). Em 2020, juntas, Magazine Luiza, Via Varejo e B2W executaram 24 aquisições de empresas de tecnologia; e finalmente
7. Agronegócio: setor secular para a sustentação da economia brasileira nos últimos 30 anos, o Agronegócio continuou a impulsionar aquisições em 2020 e mostrou extrema resiliência ao longo do ano. Algumas transações: a consolidação promovida pelas investidas dos fundos de private equity Pátria e Aqua Capital no setor de distribuição de insumos Agrícolas.
Enfim, o mundo do M&A continuou muito movimentado em 2020 por questões seculares e específicas trazidas pela pandemia.
Outro ecossistema que se movimentou muito ao longo de 2020 foram as “techs”. O Brasil continuou a apresentar os seus unicórnios ao Mundo. Dentre elas podem citar Nubank, C6 Bank, Vtex, Loft e outras. Neste caso, continua sendo relevante a capacidade empreendedora do brasileiro que é, e sempre foi, muito grande.
Esperem muita movimentação em 2021 nestes setores destacados e estimulem seus clientes empresários a ficarem atentos aos movimentos estratégicos em seus setores para tomarem a dianteira e promoverem o desenvolvimento de seus negócios.
Bom 2021!!!! E Muitos Negócios!!!
Denis Salvador Morante
Senior Partner – Fortezza
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